Desvalorização
do peso afeta bairros pobres da Argentina
Macri oferece bônus natalino a
sete milhões de pessoas devido ao “deslizamento dos preços”
Rafael
Calzada (Buenos Aires) 25 DEZ 2015 -
16:09 CET
Refeitório Pekenitos em Rafael Calzada, Buenos
Aires, durante festa natalina na quarta-feira. Ricardo Ceppi
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decreto
O Natal no refeitório Pekenitos
foi mais austero do que o esperado. Juan Argañaraz, chefe de cozinha de uma
pizzaria, criou o espaço há seis anos em sua casa em Rafael Calzada, na
periferia de Buenos Aires, para alimentar 30 crianças. Em 2015, o número foi
aumentando gradativamente até chegar a 140 crianças e 15 mães. As famílias
receberam carne, batatas, ovos e pêssegos para a ceia de Natal, mas, de uma
semana para outra, descobriu que a despesa não custaria 7.000 pesos (2.000
reais), como previsto, mas 9.000, ou 28,5% mais. Juan, que ganha 10.000 pesos
(cerca de 3.000 reais) por mês e que, com esse orçamento, sustenta a esposa e
seis filhos, teve de pedir mais recursos aos amigos que o ajudam.
A Argentina já estava sofrendo
com uma inflação alta há dez anos, com uma taxa anual de
24% em outubro. Mas, desde que o liberal Mauricio Macri tornou-se o candidato
presidencial favorito para derrotar o kirchnerista Daniel Scioli, sua promessa
de liberar o controle sobre a taxa de câmbio, com a consequente desvalorização
do peso, favoreceu a especulação sobre os preços. O controle estabelecido em 2011 pelo Governo de Cristina
Kirchner foi eliminado há uma semana, e a moeda argentina se
desvalorizou 25,7%. Segundo as consultorias Elypsis e C&T, em outubro a
taxa de inflação mensal teria sido de 1,5%; de 2% em novembro; e, em dezembro,
a previsão é de que o índice suba para 3,5%.
A associação Consumidores Livres
alertou que, na primeira quinzena de dezembro, ou seja, antes da desvalorização
da moeda, os preços subiram especialmente para a carne, macarrão, água, farinha
de trigo, sabão em pó, erva-mate (a infusão mais popular na Argentina) e leite.
Antes da desvalorização, Macri eliminou os impostos sobre as exportações agrícolas,
o que também causou impacto sobre os preços domésticos dos alimentos.
Em um refeitório da Grande Buenos
Aires, moradores relatam aumento dos preços dos alimentos
O novo presidente reagiu ao que
chamou de "deslizamentos em alguns preços na cesta básica". Nas
segunda-feira, anunciou um bônus de Natal de cerca de 100 reais para 3,6
milhões de crianças de desempregados e trabalhadores informais — que mensalmente
recebem um subsídio universal de 225 reais por filho — e para 3,3 milhões de
aposentados com pensão mínima de aproximadamente 1.160 reais. O anúncio fez com
que sindicatos de esquerda e kirchneristas suspendessem um protesto planejado
para o dia seguinte na Praça de Maio. Ao mesmo tempo, o novo Governo rejeitou
por decreto uma gratificação natalina a todos os funcionários públicos e
privados.
Rosa Pereira, de 80 anos, começou
a frequentar o Pekenitos há apenas dois meses. "Quem é o culpado pelos
aumentos? Ninguém assume a responsabilidade, mas aumentam. Tenho de comprar
tênis, mas subiram 70 pesos [19 reais], e vou ter de esperar outra oportunidade
", diz Rosa, resignada, com um sorriso.
Gisela Galeano, 27, frequenta o
refeitório há seis meses e está convencida de que Macri irá suspender o
subsídio de seus dois filhos. A campanha kirchnerista, que incutiu o medo
contra o então candidato da oposição, causou tanto impacto em Galeano que nem
sequer o bônus de Natal a convence de que o novo presidente manterá a ajuda,
iniciada por Cristina Kirchner, em 2009. "Antes do presidente assumir [o
poder], o quilo de ‘milanesa’ (escalope à milanesa) subiu de 70 pesos para 140.
Esta semana, caiu para 98 [26 reais], não sei se porque o açougueiro não estava
vendendo nada", disse Galeano.
A nova ministra do
Desenvolvimento Social da Argentina, Carolina Stanley, admitiu na segunda-feira
que o índice de pobreza no país gira em torno de 20% ou 25%, e não os 32% que
Macri denunciava durante a campanha. Sua promessa é reduzir esse índice para
zero. O tempo dirá.
Brasil e
Argentina discutem o Mercosul
Brasília, 12 (Agência Brasil -
ABr) - O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz
Fernando Furlan, informou há pouco que a reunião realizada hoje com o ministro
da Produção da Argentina, Aníbal Fernández, teve como objetivo "resolver
contenciosos comerciais". Segundo Furlan, esta é a terceira reunião que os
ministérios realizam para resolver pequenos problemas entre os dois países, com
o intuito de limpar a pauta e dar velocidade às discussões em torno do
Mercosul.
Uma outra reunião já está
agendada para abril, em Buenos Aires. O ministro enfatizou que os 16 processos
de investigação de prática de dumping que a Argentina abriu contra o Brasil nos
últimos dois anos foram reduzidos a dois. "Se formos desbastando o
contencioso, ganharemos tempo para construir uma agenda para tratar do
Mercosul", afirmou Furlan, ao comentar que, no momento, existe uma agenda
sintética e objetiva.
Outro assunto discutido hoje foi
a conjugação de esforços para os dois países trabalharem juntos na defesa
comercial. A idéia é que as equipes técnicas trabalhem juntas sempre que houver
um tema em comum sendo questionado na Organização Mundial do Comércio (OMC). Os
ministros estiveram também com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e,
segundo Furlan, a aceleração das discussões sobre o Mercosul esteve entre os
assuntos tratados.
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